Lucas Veríssimo, especial para o DIÁRIO DO PEIXE
Eu sempre tive o sonho de ser jogador de futebol. Quando era criança, meus pais eram caseiros em um clube de Jundiaí, a Incepa, e eu acordava todos os dias e já saía para jogar bola. Jogava de atacante e fazia muitos gols. Muitas escolinhas me chamavam para disputar campeonatos por toda a região.
Quando eu tinha 11 anos, meus pais decidiram se mudar para Guaimbê. Lembro que minha mãe me chamou e disse que talvez eu não pudesse realizar o meu sonho porque na nova cidade eu não teria a oportunidade de jogar futebol todos os dias como tinha em Jundiaí.
“Mãe, se tiver que ser, vai ser”, eu disse a ela.
Chegamos em Guaimbê e não tinha nada. Comecei a ver que as coisas poderiam não dar certo. Nada estava acontecendo, até que recebi uma oportunidade para jogar em um Centro de Treinamento em José Bonifácio, que tinha terceirizado o time local.
Antes de ser terceirizado, o Centro de Treinamento recebia jogador de todo o Brasil e eles pagavam uma mensalidade para jogar lá. Eu fiquei porque não tinha que pagar, mas as condições eram muito ruins.
A alimentação era precária. Comia churrasco de coração ou arroz com salsicha, quando tinha. Muitas vezes chegava com fome, pegava o arroz, colocava no prato, mas olhava melhor e tinha uns bichinhos na comida. Acho que o arroz ficava aberto e estragava. Teve muitos dias em que fui dormir com fome.
Para dormir tivemos que adaptar um vestiário como quarto. Colocamos uns beliches e eu dormia ao lado do mictório. Foi um período muito ruim. Minha mãe chegou a ir trabalhar na roça para conseguir me mandar R$ 50,00 para eu poder comer melhor.
Cheguei a voltar para casa e falar para meus pais que iria parar de jogar. Estava vendo aquele sacrifício da minha mãe, estava vendo ela sofrer e não queria mais que ela passasse por aquilo. Comecei a procurar um trabalho para que eu pudesse ganhar um dinheiro e ajudar minha família.
Nesses dias, um rapaz me ligou e me convidou para fazer um teste no Linense. Fui para Lins, fiz o teste e fui aprovado no primeiro dia. Ninguém acreditava naquilo.
Ali minha história começou a mudar.
Disputei um Campeonato Paulista Sub-17 pelo Linense e fui artilheiro do time com sete gols em 12 jogos mesmo já atuando como zagueiro. Depois disso fui disputar uma Copa São Paulo de Juniores. Joguei com jogadores nascidos em 93 e fui titular mesmo sendo 95.
Era o único jogador inscrito no campeonato sem contrato com o clube. Talvez eles não acreditassem que eu conseguiria jogar, mas joguei bem e muitos times me procuraram depois da Copa. Só então o Linense me chamou para fazer um contrato, mas eu disse que escolheria o melhor para mim e aceitei o convite do Santos.
Vi que as coisas estavam começando a acontecer como eu sonhava.
Mas logo quando cheguei no Santos peguei dengue e fiquei uma semana de cama. No mês seguinte, tive uma lesão no tornozelo e fiquei um ano sem atuar. Era ligação para casa todos os dias. Quando você está lesionado quer ter próximas as pessoas que gostam de você, mas naquele momento eu não tinha. Graças a Deus tinham pessoas boas no clube que me ajudavam em todos os momentos.
Quando voltei a jogar sabia que as coisas seriam difíceis. Comecei a trabalhar forte porque era a última opção e comecei a recuperar meu espaço.
Meu primeiro jogo no profissional foi na Bahia e a sensação foi inexplicável. Era algo que eu sempre buscava, mas só quando você vê acontecendo tem a noção do que significa.
Trouxe os meus pais para verem o meu primeiro jogo na Vila Belmiro. Quando entrei em campo e vi aquela torcida gritando, apoiando, me arrepiei da cabeça aos pés. Cheguei em casa depois do jogo e sentia a felicidade dos meus pais apenas ao olhar para eles.
Falei para eles que só dependia de mim e fiz um baita campeonato mesmo tendo sofrido uma fratura no dedinho no pé no quinto jogo. Levei uma pisão, mas estava quente e fiquei em campo. Depois fiz um exame sem o Santos ficar sabendo e ficou constatada uma fratura, mas eu não queria sair do time. Conversei com meu pai, com meu empresário e resolvi fazer um sacrifício. Eu jogava com muita dor, mas não estava prejudicando o time. Depois a fratura se consolidou sozinha, o que é muito raro de acontecer.
No final da temporada passada (2016) eu perdi espaço no time. Por isso, resolvi abrir mão das férias para trabalhar. Treinei por um longo período e, quando voltei para a pré-temporada, estava me sentindo muito bem. Nesse ano fui um dos atletas com mais jogos pelo clube e não me lesionei uma vez sequer. A temporada de 2017 foi a minha melhor temporada no Santos.
Falo para o meu pai todos os dias. Saí de casa com 13, 14 anos e tudo o que eu passei me fez amadurecer muito cedo. Isso me ajudou muito. Hoje dou valor a cada conquista, a cada centavo e quero continuar crescendo e ganhar títulos aqui no Santos.
Estou vivendo um sonho aqui. Lá atrás eu imaginava o peso dessa camisa, hoje eu sei o quanto ela significa. Sempre procurou fazer o melhor para honrá-la.
Como torcedor do SANTOS F.C posso afirmar que Lucas Verissimo foi um dos melhores em 2017. Que continue honrando o manto sagrado.