Vi a foto acima no twitter do embaixador do Santos em São Paulo, Ricardo Agostinho, e ela me despertou o interesse em levantar uma discussão: onde foi parar a torcida do Santos?
Eu acredito que sei a resposta (e quase todos os santistas devem saber também), mas queria entender qual o motivo que levou ao cenário atual e discutir algumas soluções para ele, que é um dos problemas do Santos atualmente.
A foto acima é de 2006, do jogo da entrega da Taça do Paulista diante da Portuguesa. O impacto das gerações Robinho e Neymar ainda não aparecia nas pesquisas. Na última, divulgada pelo Ibope em 2019, o Peixe já tinha crescimento nas faixas entre 16 e 24 anos e 24 e 32 anos, um claro efeito da dupla, e ainda tinha seu menor percentual entre 32 e 40 e poucos (caras que, como eu, sofreram com a fila, por serem o único santista da classe, etc).
Esse geração dos 16 aos 32 anos consome esporte de outra forma. Ele está muito presente nas redes sociais e todos os rankings digitais mostram claramente isso. No último, divulgado no início de fevereiro (veja abaixo), o Santos seguia como o quinto clube com mais seguidores digitais.
Além dos números absolutos, o Peixe tem hoje uma equipe de redes sociais que consegue engajar o torcedor. Pessoalmente, não gosto de memes como a dancinha do Soteldo e outras coisas do gênero, mas não posso negar que esse tipo de ação provoca a interação dos torcedores, especialmente nessa faixa citada acima.
Esse geração cresceu com os computadores, os smartphones, a Liga dos Campeões na TV por assinatura, os filmes no Cinemark e agora tem Dazn, Netflix e uma infinidade de opções de lazer.
Nos tempos dos jogos no rádio, do Show do Esporte da Bandeirantes com um jogo do Campeonato Italiano por semana, do Atari, dos cinemas de rua, ir a um estádio de futebol era uma opção de lazer bem mais atraente.
A geração que citamos cresceu acostumada com produtos melhores, com conforto, com serviços bons. Não é à toa que as melhores médias de público estão nas novas Arenas. Minha filha, Maria Beatriz, de dez anos, foi ver um jogo da Copa América na Arena Corinthians e me disse que o estádio parecia um shopping.
Em 2019, o Santos teve um produto bom (o time de Sampaoli era bonito de se ver) e começou a melhorar os serviços no estádio, com uma nova parceria para alimentação, etc. O reflexo apareceu de imediato. Embora tenha ficado na antepenúltima colocação no ranking da média de público (veja imagem no final do texto), o Peixe apareceu bem em outro indicador: ocupação do estádio.
O Santos foi o quinto time em taxa de ocupação de estádio no Brasileiro de 2019, com número próximo ao defendido pelo DIÁRIO. Desde a sua criação, quando surge a discussão entre jogar na Vila ou no Pacaembu, o DIÁRIO defende que o clube precisa jogar nas duas praças, mas sempre com 70% de ocupação.
A torcida do Santos está aumentando nos últimos anos e as pesquisas mostram isso. O desafio do clube passa por oferecer a esse novo torcedor um bom produto, bons serviços, fazer com que o engajamento digital se transforme em presença no estádio, como aconteceu ainda de forma tímida em 2019.
Passa por ações de marketing para aumentar o número de sócios (o Santos não está entre os dez primeiros no ranking), passa por estratégia decente de venda de ingressos (melhorou, mas ainda está longe do ideal), passa por uma precificação mais eficiente (torcida pagou um preço “caro” para ver a estreia de Jesualdo, mas não pagou para ver o jogo contra a Inter de Limeira).
Passa também por brigar pelo torcedor. A maioria dos santistas está em São Paulo (em número absoluto). Isso é algo que não tem discussão. Então, o clube não pode aceitar facilmente jogos na Vila Belmiro às 19h15min durante a semana. O torcedor que trabalha na cidade de São Paulo não consegue chegar. Parece que ninguém pegou o trânsito na entrada de Santos no final da tarde. Os torcedores do interior, então, nem pensar.
Por último, passa pelo mais complicado. Mesmo se tivesse 100% de ocupação em todos os jogos na Vila, o Santos teria apenas a 16a melhor média de público do Brasileirão. É preciso levar a sério o projeto de retrofit com a W Torre. Com 22 mil pessoas no estádio, o Peixe já seria Top 10.
A torcida do Santos é gigante, está aumentando, mas o clube precisa saber aproveitar o cenário.
O Santos não pode fazer a maioria dos jogos na Vila, se quiser aumentar o público. Não há como comparar o potencia de público da Grande São Paulo, coisa de 20 milhões de habitantes com o potencial da Baixada Santista, de 2 milhões. QUALQUER evento na Capital, vai ser mais bem sucedido em público do que um evento em Santos. Qualquer pessoa pode ver isso. Além disso, a Vila tem uma capacidade ridícula para um time grande. 13 mil pessoas para o estádio cheio e público de time pequeno. Mesmo em um clássico na Vila, com casa cheia, o público fica limitado a capacidade do estádio. As acomodações não são confortáveis. As pessoas de outras cidades ficam criticando o público de 3.500, de ontem, mas quantas pessoas se sujeitariam a sair de casa para ver um futebol ruim em dia/noite de muita chuva, sendo a maioria dos lugares descobertos. O sistema de transporte é ruim e no entorno da Vila não tem estacionamento, sem contar a violência crescente na Baixada como um todo. Ao estacionar na rua, a pessoa assume risco. O time também não empolga. O futebol que o Santos vem jogando e muito chato e chega a ser irritante, sem velocidade, com poucos chutes a gol. Ficar até às dez da noite tomando chuva para ver pouco futebol, só se for para pagar aposta ou como punição. Não há nesse elenco do Santos FC nenhum jogador que represente o torcedor em campo. Não há identidade com a camisa. Surgindo uma proposta, o jogador já diz adeus. Para finalizar, como foi muito bem observado no texto, hoje há muitas formas de diversão competindo com o futebol. Entre um jogo morno de poucas emoções, de poucos lances de efeito, de poucos jogadores de habilidade e outras diversões em que a pessoa não tenha que se deslocar, o torcedor baixa o pay per view no celular, que pode ser visto em qualquer lugar, dá uma olhada de vez em quando para ver se aconteceu alguma coisa e vai aproveitar o tempo com outras coisas.