Texto de Fernando Ribeiro para o DIÁRIO DO PEIXE
O hermano desembarcou em Vila Belmiro com status de melhor do mundo, titubeou no início, mas tornou-se um dos maiores goleiros da história do Santos
Nascido em Buenos Aires, em 22 de março de 1945, Agustín Mario Cejas é um dos maiores goleiros que já defendeu a meta santista. Dono de qualidade técnica diferenciada desde muito jovem, não demorou muito até chamar atenção do Racing Club. Pelo clube albiceleste, Cejas iniciou sua trajetória profissional em 1964, firmando-se como titular absoluto no ano de 1966, quando conquistou o Campeonato Argentino.
No ano seguinte, Cejas e seus companheiros fizeram história ao tornarem-se os primeiros argentinos campeões do Mundial Interclubes – bateram o Celtic, da Escócia, na grande final. A conquista da Copa Libertadores daquele ano é, até hoje, a única do clube de Avellaneda. Titular absoluto da meta racinguista, Cejas tornou-se, também, dono da camisa um da seleção argentina, o que abriu-lhe as portas para o mundo.
Em 1970, a lesão do goleiro Cláudio fez com que a diretoria santista colocasse a contratação de um goleiro como prioridade. O substituto Joel não teve boas apresentações, o que apressou a escolha. Os dirigentes estavam em dúvida entre o uruguaio Ladislao Mazurkiewicz e Cejas, porém as ótimas apresentações do argentino em dois amistosos diante da Seleção Brasileira, em março, definiram quem seria o guardião da meta santista.
A negociação que trouxe Cejas ao Peixe quase foi cancelada por ordens da ditadura argentina. O interventor da Associação de Futebol Argentina (AFA), Julián Martín Gaona, havia considerado o goleiro “jogador de interesse nacional”, o que proibiria sua saída do país. Para que o pudesse vir ao Brasil, o arqueiro inseriu cláusula contratual que o liberava para toda e qualquer partida da seleção albiceleste. A transferência custou aos cofres santistas 125 mil dólares, pagos em dez parcelas ao Racing.
A chegada de Cejas ao Santos provocou enorme entusiasmo em torcida e imprensa. “O Santos acaba de contratar um dos melhores goleiros do mundo: o argentino Cejas, do Racing, de Buenos Aires. Cejas pode ser considerado no mesmo nível do uruguaio Mazurkiewicz, do paraguaio Aguillera e do inglês Gordon Banks”, publicou o Jornal dos Sports, em sua edição de 11 de setembro de 1970
Cejas estreou com a camisa alvinegra em 27 de setembro, em Belo Horizonte. No empate diante do Cruzeiro, em 1×1, teve à sua frente um quarteto de fazer inveja: Carlos Alberto Torres, Ramos Delgado, Djalma Dias e Turcão. Irregular em sua campanha, o Santos não alcançou as duas primeiras posições de seu grupo no Campeonato Brasileiro e ficou de fora da fase final.
O início de Cejas com a camisa do Peixe não foi como esperado, com algumas falhas que colocaram em cheque o status que o trouxe até o Brasil. As críticas incomodaram o elenco santista ao ponto de Pelé sair em defesa do companheiro. “As pessoas vão queimar a língua”, profetizou o Rei do Futebol.
Vivendo período de transição depois de mais uma vitoriosa equipe da Era Pelé, o Santos não conseguia realizar boas campanhas e entrou em seu maior jejum de títulos desde 1955: ficou sem ganhar competições oficiais de 1969 a 1973. A torcida santista estava mal acostumada e muitos bons jogadores foram queimados neste processo. Cejas foi poupado e sua recompensa veio no último jogo do Paulistão de 1973 .
Depois de 120 minutos de futebol sem gols, o título paulista daquele ano foi decidido nas penalidades máximas. O Santos perdeu sua primeira cobrança, com Zé Carlos, mas o paredão argentino entrou em ação: defendeu as duas primeiras cobranças da Portuguesa, de Isidoro e Calegari. Carlos Alberto e Edu deixaram o Peixe em vantagem, por 2×0, quando o luso Wilsinho chutou no travessão. Cejas comemorou, os jogadores santistas correram em sua direção, os repórteres invadiram o campo e o árbitro Armando Marques encerrou a partida. O famoso erro na contagem fez com que o único título de Cejas pelo Santos tenha sido dividido com a Portuguesa.
Ainda em 1973, Cejas tornou-se o primeiro jogador “Bola de Ouro Placar”, conquistando-o junto ao uruguaio Ancheta, na primeira edição do prêmio. Ao deixar o Santos, em 1974, Cejas havia participado de 252 partidas, colocando-o como o oitavo goleiro com mais jogos pelo clube.
Ele então retornou ao seu país para defender o Huracán. Em 1976, atuou por uma temporada, sem tanto brilho, pelo Grêmio. Em novo regresso à Argentina, atuou pelo Racing (1977 a 1980) e encerrou sua carreira jogando em 1981 pelo River Plate.
O Alzheimer venceu o grande guarda metas argentino, debilitando-o ao longo dos anos e culminando com sua morte, aos 70 anos, em 14 de agosto de 2015, em sua Buenos Aires natal. A carreira de Cejas foi repleta de conquistas, inclusive o desejo realizado de jogar no maior time da Terra. “Nunca esperei que o meu sonho de jogar no Santos e ao lado de Pelé pudesse ser concretizado tão rapidamente”, declarou ao chegar no Brasil, em 1970.
Deixar um comentário