Marcelo Teixeira durante reunião do Conselho Deliberativo (Crédito: Ivan Storti/Santos FC)

Na segunda parte de sua entrevista exclusiva ao DIÁRIO DO PEIXE, Marcelo Teixeira, ex-presidente do Santos e atual comandante do Conselho Deliberativo do clube, deixa clara a sua oposição à ideia de divisão dos mandos de campo do Peixe entre Pacaembu e Vila Belmiro, implantada pelo atual presidente, José Carlos Peres, e também revela a sua decepção com o ex-presidente Modesto Roma Júnior, que chegou ao comando do Santos, no fim de 2014, com o seu apoio.

Leia a segunda parte da entrevista exclusiva de Marcelo Teixeira:

Você apoiou ativamente o ex-presidente Modesto Roma Júnior em 2014, quando ele foi eleito. No ano passado, quando ele tentou a reeleição, seu apoio foi bastante discreto. Por quê?

Foi diferente porque na eleição de 2014 nós indicamos, apoiamos, lançamos e acreditamos em um projeto e em um comprometimento dele conosco, que era o equacionamento das dívidas. Eu sabia da experiência do grupo, que conviveu demais conosco, e deu o resultado prático nesses três anos. E, dentro desse propósito, ele se comprometeu a cumprir apenas um mandato, era esse o compromisso que ele tinha conosco. Foi isso o que me decepcionou. Algumas coisas da gestão também, que foi excelente no meu entendimento, mas houve alguns momentos em que eu tinha a expectativa de que houvesse algumas ações diferentes.

E quem seria o candidato ideal?

Poderia ser uma indicação dele (Modesto) mesmo. Nada mais justo.

Por que ele não deveria ter tentado o segundo mandato? O senhor acha que um mandato é suficiente ou por algum motivo estava na hora de ele sair?

Acredito que dois mandatos são suficientes, ainda mais agora com três anos para cada mandato. Seis anos é um período adequado para você realizar um bom trabalho. Apenas porque eu conheço o Modesto, sei das questões dele de saúde, me preocupava demais essa situação porque caso acontecesse alguma coisa com ele na presidência, eu era quem tinha feito a indicação… E havia o momento político para o processo eleitoral. O que me preocupava era que o grupo mantivesse uma linha de trabalho na recuperação do clube, para o Santos recuperar o seu espaço. Muito mais do que eleger o Modesto, (a ideia) era manter uma filosofia de trabalho. Isso me preocupava, eu alertava a respeito da dúvida que existia nas urnas, da possibilidade de derrota nas urnas, que acabou acontecendo. Foram essas situações que me deixaram chateado, mas não houve problemas entre nós, pelo contrário. Mas não foi o mesmo trabalho (de campanha), nós quando conversamos com ele dissemos que não gostaríamos de fazer nenhuma exposição pública, como acabamos não fazendo, apenas um vídeo quando faltavam dois dias (para a eleição).

Em função disso, você em algum momento pensou em lançar a sua candidatura?

Não, em nenhum momento.

Nem se houvesse um consenso?

Não. Nós fizemos algumas reuniões com os grupos antagônicos e eles disseram nitidamente que apoiavam a minha candidatura, retirando a deles: (Andres) Rueda, (José Carlos) Peres e Fernando Silva. A posição deles era clara, com exceção do Modesto, por incrível que pareça. Eles não gostariam que o Modesto prosseguisse, eles gostariam que houvesse uma mudança.

Se o senhor lançasse a sua candidatura, o Modesto manteria a dele?

Então, fiquei… Eu não poderia lançar uma candidatura apoiada pelos grupos oposicionistas contra o Modesto.

Neymar e Marcelo Teixeira assinam contrato em 2009 (Crédito: Ivan Storti/Santos FC)

Mas e se houvesse unanimidade?

Não, não havia nexo! Eu agradeci demais, fizemos outros encontros na tentativa do convencimento dessa situação. Não era a minha pretensão e nem era viável pela possibilidade de tempo que eu tenho hoje. Eu sei dos meus afazeres. Eu reconheço que quando eu vou para uma missão eu tenho de me dedicar, e hoje eu não consigo, bem diferente do Conselho. Mas, dentro dessa linha, a gente podia ter encontrado um denominador comum entre os grupos, e essa era a minha tentativa.

Sua vontade era que o Modesto abrisse espaço para que um outro candidato do seu grupo lançasse a candidatura?

Um outro candidato, que poderia ser qualquer um. Ou daqueles que ali estavam, ou talvez uma outra opção que pudesse ser avaliada pelos grupos, mas não foi possível. E aí tivemos quatro chapas para concorrer, o que eu acho que não tem necessidade, o clube está muito dividido. Acho que temos condições de ter uma oposição, mas quatro ou cinco grupos acho um exagero. O que a gente percebe é uma falta de liderança. O Santos não tem uma grande liderança atualmente. Na nossa época era o Marcelo Teixeira e havia algumas boas lideranças nos grupos oposicionistas, que lutaram durante cinco eleições, dez anos, para vencer um processo eleitoral. E aí vários grupos de Santos e São Paulo se uniram com uma única finalidade (vencer a eleição). Depois, quando existiu a necessidade de convivência entre esses grupos foi que se complicou o processo, e aí não surgiram lideranças, e a situação tende a piorar.

O presidente Peres assumiu na campanha o compromisso de dividir os jogos do Santos igualmente entre Pacaembu e Vila Belmiro. O senhor acha que essa é uma boa ideia?

Nós lutamos muito para que o Santos preservasse o direito de jogar na Vila. O Santos tem uma casa, e a casa do Santos é a Vila Belmiro. A Vila Belmiro está na cidade de Santos, e o Santos é de Santos. Na minha gestão a gente fez jogos em São Paulo, no interior de São Paulo, em outros estados… Acho importantíssimo você levar o time, com apelo para o torcedor, para outras cidades. Porém, (essa situação) me preocupa, pois chegaram a noticiar que o Santos não jogaria nenhum jogo da Libertadores na Vila Belmiro, menos mal que vai jogar um (contra o Estudiantes). É tolerável, o que não se podia fazer era não jogar nenhum jogo em sua casa em um campeonato tão importante. Até porque a estrutura do Santos está na Vila Belmiro: camarotes, cadeiras cativas, uma série de interesses publicitários. Você tem de preservar aquilo que lhe dá hoje o equilíbrio financeiro, que é o estádio. Levar essa estrutura a outra cidade exige uma série de medidas administrativas que aumentam as despesas. Paralelamente a isso, você tem de avaliar bem a questão da sequência de jogos. Vocês vão gravar isso (a entrevista), e vão ver que é o que tem acontecido sempre: a sequência de jogos do Santos em uma única praça de esportes vai acarretar naturalmente em uma diminuição do público. Deixa de ser novidade. O perfil da torcida do Santos é esse, é diferenciado de algumas outras torcidas, é um perfil em que se você tiver jogos consecutivos em uma mesma praça, a tendência é diminuir o público nesses estádios.

É possível ganhar dinheiro jogando na Vila Belmiro?

Se você visa ao aspecto financeiro e quer preservar os interesses dos associados que têm cativas e camarotes, você eleva o preço da Vila Belmiro em determinados jogos, em jogos especiais, que foi o que acabou sendo feito na nossa gestão. Em jogos importantes nós cobrávamos R$ 100 o ingresso e lotava. Tínhamos rendas acima de R$ 1 milhão em jogos especiais na Vila. Não estou contra a decisão de jogar fora da Vila Belmiro, eu apenas alerto que financeiramente o resultado pode não ser o desejado, e um agravante: se você conversar com a comissão técnica e os jogadores, você vai ver que a preferência é jogar na sua casa, na Vila Belmiro. Tem uma razão especial. Se você questionar os adversários, eles também têm um certo temor diferenciado de vir à Vila e jogar contra o Santos.

Mas isso mudou um pouco nos últimos anos…

Depende da equipe que você tem. Depende das circunstâncias do momento.

Mas há um consenso entre torcedores de que a Vila Belmiro não exerce mais a pressão que exercia antes. Por que isso ocorre?

O termômetro será sempre o time de futebol. Se você tem uma equipe que está próxima do torcedor, em um clima de paixão recíproca, fica muito difícil bater o Santos na Vila. Não digo impossível, porque é um jogo e tudo pode acontecer, mas é muito difícil acontecer.

Foi na sua gestão que Neymar chegou à base do Santos e estreou como profissional. Como você vê os atritos que surgiram entre ele e o clube, depois de sua polêmica saída, em 2013? Quem errou mais nessa história?

O Santos errou mais. O Santos teve erros graves, se sujeitando a certos procedimentos como a carta que foi dada ao jogador, a redução da duração do contrato, com aumento de valores e diminuição de tempo de contrato. Acho que as medidas adotadas foram medidas em que ou você vendia ou ficava refém do mercado, não do pai ou do jogador, mas do mercado. Qualquer pai faria e defenderia seu filho como o pai dele fez, de uma forma correta e profissional, dados os instrumentos que ele tinha. Eu acho que depois nós deveríamos ter uma aproximação para que pudéssemos reivindicar e lutar pelos direitos do Santos contra o Barcelona, e não contra o jogador. Fico muito triste em ver a imagem que ficou, um atleta que é fenomenal, que eu comparo hoje aos principais ídolos que o Santos já teve. O Neymar é quem chega mais próximo ao Pelé. Muito próximo. Ele é um jogador fantástico, fora de série.

Nesse ponto o senhor concorda com o presidente Peres, que quer uma reaproximação com ele?

É que agora é uma reaproximação diferente. É uma reaproximação onde já existe uma ferida.

Existe uma decepção com o Modesto pela forma como ele lidou com essa questão?

É… Acho que são procedimentos em que você tem de ter o resguardo do clube, são medidas importantes em que você toma certas decisões que nem sempre são benéficas dentro de um processo em que o clube poderia ter um resultado melhor.

Leia a primeira parte da entrevista exclusiva de Marcelo Teixeira: http://bit.ly/2GaXBNv